quarta-feira, 1 de março de 2017

Caminhada Noturna

Verão, época do ano em que o céu está frequentemente limpo, facilitando a visualização das estrelas, e tornando passeios noturnos ainda mais agradáveis. Neste horário, além do clima fresco, não há muito movimento, o que faz os pensamentos fluírem mais facilmente.
Acompanhado apenas pela minha sombra, caminho distraído, imaginando as tarefas que preciso concluir durante a semana, já é quarta-feira.
Silêncio total, comum nessa região, a não ser pelo ruído do vento nas árvores, alguns latidos distantes, e o som dos meus passos. Penso na tranquilidade em que tenho vivido os últimos dias, tudo parecia estar bem, e eu não sabia o porquê, mas algo estava fora do lugar.
Repentinamente, lembro de uma brincadeira que meus amigos faziam, anos atrás. Quando estávamos juntos, geralmente durante a madrugada, na rua, em silêncio, após algum barulho qualquer chamar nossa atenção, um de nós sempre dizia: "Ouço ruídos!", em alusão aos clássicos do suspense, nos quais tal expressão ocorre com frequência, seguida de frases como: "Acho que corremos perigo, vamos dar o fora daqui!".
Repito mentalmente essas palavras, uma, duas, três vezes. Em seguida, digo em bom som: "Ouço ruídos!". Neste exato instante, sinto meu coração disparar. Um barulho grave atrás de mim interrompe meus devaneios, e me traz instantaneamente para um estado de pânico. Continuo caminhando, lentamente, com as pernas trêmulas, enquanto decido se olho ou não para trás, se tento correr, se grito, ou se apenas tento ignorar o ocorrido. As mãos suam, o silêncio torna-se incômodo e angustiante, tenho a sensação de que estou sendo observado. Resolvo que devo tentar descobrir o que havia causado aquele som aterrador, e volto o corpo para a direção oposta a que seguia. Rio. A causa de meu susto havia sido um gato. Um pequeno felino inocente e gracioso, que neste momento me olhava com seus olhos brilhantes, refletindo o luar. Digo: "Ainda bem que apenas nós dois presenciamos esta cena, não é mesmo?". O gato parece concordar, e mia graciosamente.
Olho para cima e vejo a lua incrivelmente bela por trás de algumas poucas nuvens que se movem rapidamente, estendidas até a escuridão total no horizonte. A cena é estonteante, a composição é perfeita, e uma paz toma conta de mim instantaneamente. Lembro-me do gato, e sinto que este não me parecia estranho. Ao olhar novamente para onde o vi, não estava mais lá! Gatos são tão misteriosos quanto belos.
Tenho a impressão de que o frio está aumentando, e resolvo retornar para casa, a noite parecia, de certo modo, perigosa para mim.
Ao tentar andar, sinto meus pés presos ao chão, o pânico retorna, percebo também que não conseguia mexer os braços, pois tentei inutilmente pegar o celular que estava em meu bolso.
Tento gritar, porém nesse instante uma mão gelada cobre minha boca, pressionada com força contra meu rosto, eu posso sentir os ossos entrando lentamente em minha pele, que dolorosamente rasga nos pontos em que é tocada por aqueles dedos. A tentativa frustrada de fechar os olhos só não foi pior porque estou em completa escuridão, a não ser por um par de olhos vermelhos que me fitavam à distância, contudo aproximando-se de mim lentamente. Escuto vozes sussurrando em uma língua desconhecida, e diversos gritos desesperados pareciam vir de longe. Enquanto aqueles olhos se aproximavam eu conseguia distinguir um formato humanoide, exceto pela cabeça, que estava coberta por um longo capuz.
Recupero meus movimentos, e saio correndo, mas todas as direções parecem iguais no escuro. A misteriosa figura está se aproximando rapidamente, já estava a poucos metros de distância quando percebo do que se tratava, o terror toma conta de mim por completo, fecho os olhos com força, sinto lágrimas escorrendo nas feridas do meu rosto.

O som do despertador nunca foi tão adorável.

Trilha sonora recomendada: Iron Maiden - Fear of The Dark.